quinta-feira, 31 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 8

 

Quanto baga, brimo?




Você sabia que os árabes fizeram parte da formação gastronômica brasileira,  desde a chegada dos primeiros europeus no Brasil?
Como? — você deve estar retrucando aí na sua mente. — Esse André deve estar maluco! Como assim se o primeiro árabe chegou oficialmente no nosso país só em 1878?
Calma que eu explico...
A Europa sofreu forte influência dos árabes. Primeiro pelo comércio, depois pela dominação política e depois pela miscigenação que restou do império Turco-Otomano.
Os árabes vendiam alimentos e temperos, indianos, africanos e especiárias orientais, através das rotas comerciais, que ligavam o Oriente e a África, à Europa.
Depois, com o avanço do império Turco-Otomano, após a queda de Constantinopla em 1453, a alimentação dos países europeus — principalmente dos países mediterrâneos — foi invadida pela culinária árabe.
Azeite, iogurte, coalhada, cominho, grão-de-bico, lentilha, gergelim, salsinha, hortelã, carne de cordeiro, frutas secas, pimenta-do-reino, pães sem fermento, kafta, e modos de preparo, foram algumas das contribuições dos árabes nesse período de império.
Não que todos esses produtos sejam originalmente árabes, mas faziam parte de sua alimentação. Com a expansão de seu império e comércio, acabaram assimilando tudo isso em sua gastronomia e passaram para frente, fazendo assim uma grande corrente cultural e gastronômica.
Então — provando minha lucidez — os árabes contribuíram para a formação da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia, mesmo antes da chegada dos primeiros "brimos", por aqui.
Eles começaram a chegar em 1878, e em sua maioria eram sírios e libaneses. Como estavam sobre o dominio do império Turco-Otomano lá em sua terra natal, aqui foram chamados simplesmente de "turcos."
Os árabes logo se enturmaram muito bem na sociedade brasileira. Hábeis comerciantes, carismáticos e expansivos, eles se estabeleceram na área urbana das pequenas cidades do interior do Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Por dificuldade de comunicação, trouxeram um sotaque muito peculiar à nossa gente — influenciando bastante jeito de falar do paulistano. 
Chamando a todos de brimos (pois eles  trocam o P pelo B), ficaram também conhecidos assim.
Todo mundo era primo deles e eles eram primos de todo mundo.
Com a chegada deles, muitos produtos que já existiam em nossa culinária, mas que eram timidamente usados, ganharam grande importância.
O trigo cru, usado em saladas, e em preparos com iogurte e coalhadas. 
A carne moída, de boi e de cordeiro usada nas esfirras, kibes e kaftas. 
A salsinha, agora usada como parte dos pratos e não só como enfeite. 
O hortelã, o gergelim, o grão-de-bico e suas várias formas de apresentação. 
E talvez o mais usado! O azeite, que veio para ser opção às gorduras de origem animal e que rapidamente virou essencial em nossa cozinha.
Doces feitos com massa folhada, nozes, castanhas e mel, além de doces à base de goma — aqueles coloridos, que invadiram os bares e mercadinhos do Brasil — também ganharam um espaço dentro do nosso coração.
Esses pratos não competiram com os que já existiam aqui, pelo contrário, eles se adaptaram à nossa base culinária.
Por isso, não é raro vermos em uma mesma mesa — em várias festas por aí — coxinha, esfirra, coalhada seca, homus, caponata de beringela, espetinhos de carne bovina, torresmo, saladas variadas, tabule, queijos finos, queijos da Serra da Canastra, polenta frita, almondegas, medalhões de frango, linguiça frita, preparos com iogurte, pães sem fermento, pães gratinados, tomates secos e mais uma infinidade de combinações e delicias.

Uma vez, eu falei para a minha esposa:
— Hoje você vai comer um doce mais gostoso que chocolate.
— Isso não existe! — ela respondeu quase gargalhando da minha cara.
Então eu dei pra ela um pedaço de Halawi, o melhor doce do mundo! 
Memória afetiva — então, por favor não me venha falar que não gosta.
Ela mordeu um pedaço e no mesmo instante parecia que estava comendo um doce feito no céu!
— Olha — ela falou quase assustada — não sei se é melhor que chocolate, mas que é muito bom... Isso é...



12 comentários:

  1. Rapaz, gosto mais da comida árabe que da italiana, até. Berinjela, grão de bico, coalhada seca, bônus, tabule... faço sempre que posso, que tenho tempo.

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    1. Azarildo, eu também gosto muito.
      Tem um lugar aqui em Barretos que eles fazem muito bem.

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  2. Adoro os quibes e um pouco desse doce. Mas não o compraria por escolha minha,rs... Bom saber das raízes todas! abraços, chica

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  3. Cheguei 👏🏻👏🏻👏🏻
    Vamos a leitura desta maravilha 🙌🏻

    André, meu querido, terminei seu texto com três sensações:
    1. Gargalhada.
    2. Fome.
    3. Vontade de te chamar pra almoçar aqui em casa (desde que você traga o Halawi, claro).
    Você começou jogando a bomba:
    “os árabes influenciaram a nossa culinária antes mesmo de chegarem oficialmente ao Brasil!”
    Na hora pensei: “lá vem teoria da conspiração gastronômica”. Mas aí você me vem com rota comercial, queda de Constantinopla, império Turco-Otomano e de repente tô aqui, refletindo sobre como a coalhada e o azeite atravessaram séculos e oceanos até cair no meu prato. E quando achei que já tava convencida, você me ataca com a parte mais perigosa: os doces. Aí não tem argumento, tem emoção. Massa folhada, castanha, goma colorida… foi batata. Fui direto ver se tinha um docinho árabe na geladeira. (Não tinha. Só um Danoninho. Tristeza define.)
    A cena da sua esposa duvidando que existe algo melhor que chocolate é digna de Oscar. Senti a mordida no Halawi daqui. E essa parte de “não sei se é melhor que chocolate, mas é muito bom…” é exatamente o que a gente sente quando descobre um novo amor culinário. É quase traição emocional ao cacau, mas a gente aceita.😌 E ainda teve os “brimos”! Essa explicação foi um show à parte. Adorei o resgate do sotaque, da confusão de letras, da carne moída que já tava aqui mas ganhou status de celebridade depois que virou esfirra. É história contada com afeto, riso e cheiro de comida boa.
    Seu texto devia vir com aviso: “Leia alimentado ou acompanhado de um prato de tabule.” Porque, André, se isso não é uma crônica deliciosa, eu não sei mais o que é. E agora, com licença, que vou ali tentar convencer meu esposo que Halawi existe, sim e que a gente precisa urgentemente achar um mercadinho árabe por aqui aff 😓 kkkk

    Beijo amigão
    Fernanda!

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    1. Fernanda!!
      Menina, já comeu halawi? É ou não é um doce maravilhoso?
      Aqueles da lata, da marca Istambul então! Meu Deus... Ops! Alah... como os fabricantes devem falar.
      Que legal, que você tem gostado das postagens.
      E que legal que se todou, que no fundo, mesmo com história e fatos, todas elas não passam de crônicas.

      Vai lá... Procura um mercadinho árabe e come um Halawi.

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    2. André!!
      Menino, eu vivi o Halawi! Que delícia é aquilo? Aquela textura que derrete, aquele gostinho de infância inventada, de memória emprestada… Fui ao mercadinho como quem vai à Meca em busca do doce sagrado. E achei! Istambul mesmo, a da lata dourada. Quase chorei. Quase escrevi uma crônica só sobre ele (aliás, não duvide se aparecer…). E sim, você me leu bem: no fim, tudo em mim vira crônica. Até o Halawi. Obrigada pelo carinho de sempre.

      P.S.: Alah é pai! E é doce também.
      😉😘

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    3. André!!
      Mandei a resposta que era para ser a primeira kkkkk
      Mas vou mandar assim mesmo kkk
      Você me deixou com desejo de Halawi uma hora dessa, da noite. Isso é quase um crime previsto na Constituição dos Doces Injustiçados.
      Sim, comi. Sim, amei. E sim, quase cometi um pequeno exagero gastronômico sabe aquela lata da Istambul? Pois então, ela que lute pra durar a semana.
      Aliás, agora tô achando que minhas crônicas deviam vir com uma colherzinha de chá de gergelim e uma nota de rodapé dizendo: “comer lendo”. Você fala que elas “não passam de crônicas”… mas olha: às vezes elas também são receita, sobremesa e declaração de amor disfarçada.
      Vou ali procurar outro mercadinho. Vai que encontro inspiração… ou outra lata. Kkkkk

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    4. Kkkkkkkkkkk.
      Você é um barato Fernanda.
      Sabia que você ia comer Halawi.
      Kkkkkkkkkkk

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    5. Você nunca tinha comido Halawi?
      Então me fala uma coisa: Tá pau a pau com chocolate, não tá?
      Kkkkkkkkkkk.

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  4. Olá, amigo André!
    Gosto muito dos doces árabes, em Cabo Frio e em Petrópolis eu comia os típicos bem autênticos.
    Amanhã devo fazer quibe, tabule também é gostoso.
    Seu post me faz engordar uns quilos...
    Vou procurar o tal doce do céu...
    Tenha dias abençoados!
    Abraços fraternos de paz

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    1. Rosélia, procura num mercado bom.
      Vem numa lata, da marca Istambul.
      Se chama Halawi, se fala ralêu.

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