Quando eu
tinha quatorze anos mais ou menos, eu era um avido leitor. Lia quadrinhos,
revistas e livros geralmente emprestados na biblioteca da escola onde estudava.
Falando nisso; que biblioteca maravilhosa! Com livros luxuosos, raros e impecavelmente
cuidados pela “moça chata que não dava mais de duas semanas pra gente ler qualquer
livro, fosse ele do tamanho que fosse.”
Eu já
havia lido, Dartagnan e os três mosqueteiros, As aventuras de Simbad o marujo, As
aventuras de Guliver, Hobin Hood, muitos livros da coleção Vagalume e mais alguns
clássicos infanto-juvenis muito famosos, até que um belo dia, a “moça chata que
não dava mais de duas semanas pra gente ler qualquer livro, fosse ele do
tamanho que fosse”, me chamou e disse:
- André,
hoje eu vou escolher um livro para você ler.
- A... a
senhora?
- Isso! –
respondeu ela se levantando e buscando um livro na prateleira onde se lia:
Clássicos, literatura europeia. – Esse aqui! – falou, estendendo a mão e me
entregando: A ilha do Tesouro, de Robert Louis Stevenson.
- E por que
a senhora quer que eu leia esse livro?
- Porque
eu tenho acompanhado suas leituras e acho que já está na hora de você ler esse
livro. Vou te dar duas semanas.
- Ah é? –
respondi olhando o livro relativamente pequeno nas minhas mãos. – Uai? Livros
de 400 páginas a senhora também dá duas semanas, por que esse de cento e poucas
a senhora vai me dar as mesmas duas semanas?
- Porque
você vai ler esse livro duas ou três vezes seguidas.
- Vou? A
senhora está me mandando fazer isso?
- Não! O
livro vai te mandar fazer isso e você não vai resistir.
Gente!
Essa “moça chata que não dava mais de duas semanas pra gente ler qualquer
livro, fosse ele do tamanho que fosse” sabia do que estava falando!
O livro “A
ilha do tesouro”, foi escrito em 1883, de uma forma inovadora. Ele tem dois narradores:
O narrador onipresente, comum em 90% dos livros e o jovem Jim Hawkins, que é o
herói da história. O engraçado é que esses narradores se entrelaçam e contam a
história sob seus pontos de vista e em nenhum momento você se perde no assunto,
ou se confunde com quem está “falando com você.”
O clima do
livro é tão cativante que não tem como você não ser absorvido pela leitura! Não
tem como você não virar um pirata ou um aventureiro perdido no mar. É mágico!
Hoje,
trinta e tantos anos após esse dia, eu percebo que tudo, exatamente tudo o que
existe em histórias de piratas no cinema, nos quadrinhos, nos desenhos e até em
histórias de aventuras e mistério, ou se inspiraram na “Ilha do Tesouro”, ou se
inspiraram em alguma obra que se inspirou nele. Pasmem, até em Guardiões da
galáxia, o primeiro filme da Marvel, a gente vê traços da “Ilha do tesouro.”
Para mim,
foi uma das obras mais importantes que li, mesmo, lógico, sabendo que é uma
obra clássica, mas, infanto-juvenil.
Eu não me
lembro mais o nome da “moça chata que não dava mais de duas semanas pra gente
ler qualquer livro, fosse ele do tamanho que fosse”, mas tenho um grande amor
por ela, guardado aqui em meu coração! Amor e agradecimento.
Depois de
alguns meses ela “escolheu” outro livro para mim: O tempo e o vento de Érico
Verissimo, mas essa história vou contar outro dia!
Hoje, é
dia de indicar para vocês: “A ilha perdida, de Robert Louis Stevenson.” Um
livro que vai te consumir, entrar na sua cabeça, te encantar e te fazer acabar
de ler, voltar à primeira página e começar a ler novamente! Eu li, três vezes
em duas semanas!
É... A “moça
chata que não dava mais de duas semanas pra gente ler qualquer livro, fosse ele
do tamanho que fosse”, podia ser chata na época, mas hoje é minha amiga. Uma
amiga que sabia muito das coisas. Uma bibliotecária que fazia jus ao seu
salário e ao amor pelos livros!
Deus a
abençoe, esteja ela onde estiver.