quinta-feira, 31 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 8

 

Quanto baga, brimo?




Você sabia que os árabes fizeram parte da formação gastronômica brasileira,  desde a chegada dos primeiros europeus no Brasil?
Como? — você deve estar retrucando aí na sua mente. — Esse André deve estar maluco! Como assim se o primeiro árabe chegou oficialmente no nosso país só em 1878?
Calma que eu explico...
A Europa sofreu forte influência dos árabes. Primeiro pelo comércio, depois pela dominação política e depois pela miscigenação que restou do império Turco-Otomano.
Os árabes vendiam alimentos e temperos, indianos, africanos e especiárias orientais, através das rotas comerciais, que ligavam o Oriente e a África, à Europa.
Depois, com o avanço do império Turco-Otomano, após a queda de Constantinopla em 1453, a alimentação dos países europeus — principalmente dos países mediterrâneos — foi invadida pela culinária árabe.
Azeite, iogurte, coalhada, cominho, grão-de-bico, lentilha, gergelim, salsinha, hortelã, carne de cordeiro, frutas secas, pimenta-do-reino, pães sem fermento, kafta, e modos de preparo, foram algumas das contribuições dos árabes nesse período de império.
Não que todos esses produtos sejam originalmente árabes, mas faziam parte de sua alimentação. Com a expansão de seu império e comércio, acabaram assimilando tudo isso em sua gastronomia e passaram para frente, fazendo assim uma grande corrente cultural e gastronômica.
Então — provando minha lucidez — os árabes contribuíram para a formação da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia, mesmo antes da chegada dos primeiros "brimos", por aqui.
Eles começaram a chegar em 1878, e em sua maioria eram sírios e libaneses. Como estavam sobre o dominio do império Turco-Otomano lá em sua terra natal, aqui foram chamados simplesmente de "turcos."
Os árabes logo se enturmaram muito bem na sociedade brasileira. Hábeis comerciantes, carismáticos e expansivos, eles se estabeleceram na área urbana das pequenas cidades do interior do Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Por dificuldade de comunicação, trouxeram um sotaque muito peculiar à nossa gente — influenciando bastante jeito de falar do paulistano. 
Chamando a todos de brimos (pois eles  trocam o P pelo B), ficaram também conhecidos assim.
Todo mundo era primo deles e eles eram primos de todo mundo.
Com a chegada deles, muitos produtos que já existiam em nossa culinária, mas que eram timidamente usados, ganharam grande importância.
O trigo cru, usado em saladas, e em preparos com iogurte e coalhadas. 
A carne moída, de boi e de cordeiro usada nas esfirras, kibes e kaftas. 
A salsinha, agora usada como parte dos pratos e não só como enfeite. 
O hortelã, o gergelim, o grão-de-bico e suas várias formas de apresentação. 
E talvez o mais usado! O azeite, que veio para ser opção às gorduras de origem animal e que rapidamente virou essencial em nossa cozinha.
Doces feitos com massa folhada, nozes, castanhas e mel, além de doces à base de goma — aqueles coloridos, que invadiram os bares e mercadinhos do Brasil — também ganharam um espaço dentro do nosso coração.
Esses pratos não competiram com os que já existiam aqui, pelo contrário, eles se adaptaram à nossa base culinária.
Por isso, não é raro vermos em uma mesma mesa — em várias festas por aí — coxinha, esfirra, coalhada seca, homus, caponata de beringela, espetinhos de carne bovina, torresmo, saladas variadas, tabule, queijos finos, queijos da Serra da Canastra, polenta frita, almondegas, medalhões de frango, linguiça frita, preparos com iogurte, pães sem fermento, pães gratinados, tomates secos e mais uma infinidade de combinações e delicias.

Uma vez, eu falei para a minha esposa:
— Hoje você vai comer um doce mais gostoso que chocolate.
— Isso não existe! — ela respondeu quase gargalhando da minha cara.
Então eu dei pra ela um pedaço de Halawi, o melhor doce do mundo! 
Memória afetiva — então, por favor não me venha falar que não gosta.
Ela mordeu um pedaço e no mesmo instante parecia que estava comendo um doce feito no céu!
— Olha — ela falou quase assustada — não sei se é melhor que chocolate, mas que é muito bom... Isso é...



segunda-feira, 28 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 7

 

Reunione na cossina!




O dia começava cedo na fazenda.
Era época de colheita de café.
Os homens da colônia acordavam cedo, tomavam café pingado com leite, comiam bolo de fubá, queijo, biscoitos de polvilho e ovos mexidos. 
Muitos, antes de irem trabalhar na colheita, tratavam primeiro de seus porcos, de suas galinhas e tiravam leite de suas vaquinhas e aguavam as suas hortas.
O patrão — dono da fazenda — permitia que cada colono tivesse alguma coisa para chamar de sua.
Naturalmente, que uma parte desses produtos, acabava na despensa da casa-grande. Nessa divisão específica, os colonos eram chamados de "meeiros"— pois cultivavam suas hortaliças e verduras, criavam seus animais e dividiam tudo com o patrão.
Era uma forma de incentivo para os colonos, que ganhavam pouco, e trabalhavam muito.
Os galos, desde a madrugada, desafiavam os sapos e os primeiros pássaros, numa cantoria sem fim.
Um coachava daqui, outro cantava dali e o outro se esganiçava em seu altíssimo cocoricóóóóóóó, que era o despertador da natureza.
Na casa-grande, o fogão à lenha soltava a fumaça tranquila pela chaminé — o que já dizia, que a cozinheira da família, a negra, filha de escravos, Maria das Dores, chamada carinhosamente de Das Dor, já tinha o café da manhã posto à mesa.
— Quinzinho, — disse Das Dor, colocando o bolo de fubá, na frente do patrãozinho, Joaquim, filho mais velho de seu Tonico Junqueira, dono da fazenda —, o seu pai está com uma cara triste.
— Ah... Das Dor, a mãe disse que ele reclamou ontem de alguma coisa.
— Ocê não sabe o qui é?
— Não sei, mas parece que ele está com saudade de alguma coisa.
— Sardade?
— Saudades de macarronada. — respondeu dona Sueli entrando na cozinha e no assunto.
— Verdade patoa? Sardade de  macarronada?
— Você acredita nisso? — respondeu Sueli, servindo-se de uma xicara de café e pegando um mané pelado que já estava fora da folha de bananeira.
— Uai patroa, a gente pode falar com a dona Francesca e a dona Carmelita, que moram na colônia e pedir pra elas fazerem para o patrão.
— O problema é que a gente não tem farinha de trigo, Das Dor. E sem farinha de trigo não dá pra fazer macarrão.
— Quinzinho. — falou a cozinheira virando-se para o jovem patrãozinho. — Acaba de cumê e vai lá na colônia chamar elas pra mim. Ocê faz isso, meu fio?
— Lógico que faço! O que a senhora me pede que eu não faço?
— Olha só esse aí! — reclamou Sueli fazendo cara de desdém. — Só porque você foi ama-de-leite dele, ele te respeita mais do que a mim!
— Não fica com ciúme não, dona Sueli! Esse Quinzim, pra mim, é um neto que eu não tive.

*****

Meia hora depois, Das Dor explicava para as "mamas" italianas o problema gastronômico, que deixava saudade em seu Tonico.— Olha Das Dor — falou dona Francesca gesticulando com os braços como boa italiana — non é fácil fazere macarrone sem farina de trigo.
— Non Francesca — retrucou Carmelita — esso é impossibile! Non tem como fazêre esso!
— Eu sei. — explicou Das Dor, com muita paciência. — Mas eu pensei em fazer um angu de milho e colocar o molho de carne picadinha.
— Ragu de carne moída?
— Isso, dona Francesca.
— Non fica bom!
— Porque non fica bom? — perguntou Carmelita que ao ouvir a cozinheira negra, achou que fazia algum sentido.
— Non fica bom, porque o angu de milho tiene gosto de milho e o macarrone é una massa sem sabore! O sabore da macarronada vem do ragu e do quêjo!
— Bom isso é verdade. — concordou Carmelita.
— Ah... — resondeu Das Dor em meio a um suspiro. — Eu queria tanto deixar seu Tonico contente.
— Bom... — falou Francesca olhando para cima, como se vasculhasse suas ideias. — E se a gente fizesse una massa base neutra, sem o milho.
— E fazemo com quê Francesca? Tá maluca?
— Carmelita, você tem que me dexare falare! — gesticulou Francesca com cara de brava.
— Enton fala! Enton fala! Mas só quero vere, con quê vamo fazere a massa.
— A gente pode fazere con fubá, água e sal.
— Sem tempero? — estranhou a cozinheira oficial da casa-grande. — Os patrão gosta de tempero.
— Io sei, mia amiga! — respondeu Francesca pegando nas mãos da negra e sorrindo. — Os tempêro vem do ragu e do quêjo!
— Ma, ma, ma, ma! — interrompeu Carmelita abrindo os braços. — Essa massa de fubá vai ficare mole! Nun vai dá certo!
— Eia Carmelita, me escuta! A gente faz a massa neutra. Depois dêxa esfriare numa forma e por esso ela vai ficar firme, aí a gente cobre ela inteira de ragu quente na hora de servire e rala o quêjo mea cura por cima!
— Mas, e quando colocar o ragu quente, a massa não vai amolecer?
— Non, Das Dor! Pode ficar tranquila, mia amiga! Vai dar certo.

*****

Na hora do almoço, a forma com a massa neutra de fubá, coberta com molho de carne moída e queijo ralado, foi servido para a família dos Junqueira.
A forma não deu para quem quiz.
O gosto, lembrou muito uma macarronada, e o seu Tonico, deixou escorrer uma lágrima quando deu a primeira garfada.
Das Dor chorou com suas amigas italianas no canto da cozinha, quando viu a lágrima escorrer pelo rosto do patrão.
Ao final do almoço, Francesca e Carmelita foram convidadas a trabalhar na cozinha da casa-grande, para ajudarem Das Dor no dia a dia.
À noite, antes de se recolherem, Sueli foi até o quarto de Das Dor, lhe deu um abraço e disse:
— Obrigado minha amiga! O que você fez hoje, foi muito importante.

*****

Esse prato, logo se tornou essencial no cardápio dos brasileiros.
Mais adiante, esse prato ganhou o nome de polenta, e aos poucos substituiu o angu feito de milho verde.
No Brasil inteiro, de norte a sul, de leste à oeste, a polenta está presente. Feita com carne moída, com galinha, com peixe, com molho de legumes. 
Ele é tão importante para o brasileiro, que já salvou e ainda salva muitas vidas, em famílias, que infelizmente não tem o que comer.
Fubá, água e sal, por incrível que pareça é muito barato e tem grande valor nutritivo.
Eu sei, que provavelmente as coisas não aconteceram da forma como eu descrevi nesse conto.
Mas ele não pode ser descartado. 
Os imigrantes italianos usavam a polenta neutra sim, para substituir o macarrão de trigo.
E essa fusão de pessoas dentro das cozinhas das fazendas, foi a riqueza, que criou nossa base gastronômica, principalmente da Paulistânia.


A nossa série está acabando.
Acho que mais duas ou três postagens, eu termino o que queria apresentar.
O último capítulo também será um conto. 
Talvez tão grande quanto esse.
Me perdoem, pois sei que a linguagem dos blogues é feita de postagens curtas.
Mas realmente foi necessário!


No próximo capítulo: Os brimos chegam ao Brasil!


quinta-feira, 24 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 6

 


Tipicamente falando...




Pronto! 
Como eu disse na última postagem: montamos o cenário!
O Brasil — principalmente na região que interessa para nossa reflexão sobre a gastronomia, que é a Paulistânia — já estava composta por fazendas de café, gado leiteiro, cana-de-açúcar, fumo e outras culturas menores.
O escravo negro não era mais a mão de obra utilizada e os indígenas praticamente haviam voltado para o interior das matas.
Os fazendeiros eram, em sua maioria, descendentes de portugueses: de primeira, segunda e até a terceira geração, nascidos no Brasil. 
Isso se refletia na cozinha, onde receitas de doces, pães, bolos, cozidos, assados, e mais um monte de coisas gostosas, sofriam tentativas de reprodução, com os produtos que existiam aqui. 
Na maioria das vezes, essa reprodução não conseguia ser fiel, e isso culminava na criação de uma receita nova. Única, e não menos deliciosa.
Muitas mulheres negras, ótimas cozinheiras, ainda trabalhavam nas cozinhas das sedes das fazendas, e agora, seriam acompanhadas pelas "mamas", italianas em sua maioria, que aos poucos chegavam para trabalhar e morar nas colônias dessas fazendas.
Os europeus que não tinham dinheiro, e que vinham para o Brasil na ilusão de uma vida melhor, foram aos poucos sendo contratados primeiramente para trabalhar no interior de São Paulo e Minas Gerais. E daí, aos poucos, se transferiam para o Paraná, Mato Grosso e Goiás.
O milho e a mandioca, produtos que na Europa ainda tinham pouca relevância, aqui era o suprassumo da alimentação da época. Por isso a polenta, feita com galinha e acompanhada com quiabos refogados, se tornou um dos maiores clássicos de Minas e São Paulo.
A dobradinha, que tinha um ancestral português — a dobrada portuguesa — aqui ganhou tempero da roça, com pimentas nativas, caldo de galinha, tomates frescos e feijão branco, tornando-se um dos pratos essenciais do almoço de domingo nas crescentes áreas urbanas e principalmente nas fazendas. Mas isso, com o toque de Midas, que foi o acompanhamento, que poderia ser farinha de mandioca simples ou uma farofa um pouco mais incrementada.
A farofa, que já existia antes da chegada dos imigrantes, feita com farinha de mandioca ou de milho, agora ganhava ar de protagonismo. Mais elaboradas, agora eram feitas de miúdos de galinha ou porco, de ovo, de banana, de cebola caramelizada e de tudo que lembrasse as farofas europeias, feitas geralmente com farinha de rosca, obtidas à partir de pães amanhecidos.
Alguns temperos típicos e regionais, como o Pequi, que é uma herança indígena, foram incorporados aos mesmos pratos, à medida que os imigrantes chegavam nas fazendas de Goiás e Mato Grosso.
Aos poucos, esses pratos começaram a ser difundidos na Paulistânia, ganhando ar de — comida típica local — e se diferenciando de outras regiões do Brasil, como o Nordeste e o Sul.
No próximo capítulo, vamos entrar dentro de uma cozinha da roça e acompanhar uma conversa entre duas mamas italianas e uma cozinheira negra.
Elas vão tentar fazer macarrão, mas como aqui quase não existia farinha de trigo, elas vão inventar — ou adaptar — um produto conhecido que virou um clássico brasileiro, esse sim, não ficou apenas na Paulistânia, mas ganhou o país.

Comente aí, que prato você acha que é esse?



segunda-feira, 21 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 5

 


Mocinhos ou bandidos? O início de tudo.




Nós já voltamos no tempo 3 vezes para falar da culinária brasileira — especialmente da Paulistânia.
Hoje vamos dar uma passeada por diferentes épocas. Nossa reflexão começa antes da chegada dos negros e termina já na fase dos imigrantes.
O personagem em que vamos focar nossas atenções, não é o cara mais carismático da nossa história — principalmente nos dias de hoje, em que as pessoas estão olhando mais para a forma em que as coisas foram feitas, e não para o que foi feito.
Mas aqui fica uma pergunta: naquele tempo, com as condições em que eles viviam, com a mentalidade, a ética e a moral da época... será que eles foram mesmo errados?
Hoje vamos falar dos Bandeirantes.

Os bandeirantes eram grupos de homens paulistas. Moradores da Capitania de São Vicente.
Inicialmente trabalhavam por conta própria, e percorriam o interior do Brasil em busca de indígenas para escravizar, riquezas minerais e rotas desconhecidas. 
Com o tempo, passaram a trabalhar para a Coroa Portuguesa, ajudando na expansão territorial e exploração das riquezas coloniais.
Os bandeirantes eram formados por portugueses e pessoas nascidas aqui no Brasil. Alguns já eram mestiços, filhos de portugueses com indígenas.
Até esse momento a culinária brasileira praticamente não existia.
Os habitantes das Capitanias Hereditárias comiam produtos trazidos da Europa e acrescentavam alguns produtos indígenas, como a mandioca, milho e caça.
Os bandeirantes tinham esse nome, porque as expedições que faziam para adentrar as matas eram chamadas de Bandeiras.
À medida que iam adentrando o país, esses bandeirantes estabeleciam rotas, descobriam produtos interessantes para a comercialização e estabeleciam povoados, que aos poucos foram originando pequeninas cidades.
Geralmente atrás dos bandeirantes, vinham os padres jesuítas, que em cada cidadezinha, abriam missões, com a intenção de catequisar indígenas, lhes ensinar a fé cristã e "domesticá-los", para serem usados para os interesses comuns tanto da igreja, quanto da Coroa Portuguesa.
Os Bandeirantes eram rústicos. Homens talhados para sobreviver com pouco. Sua alimentação baseava-se em carne seca, feijão, farinha, e coletas que encontrassem no meio do caminho.
O arroz com charque e feijão gordo, como conhecemos hoje, são herança desses Bandeirantes. 
O tutu de feijão, a paçoca de farinha de mandioca com charque, também é herança bandeirante.
Muitas frutas, raízes e produtos indígenas, foram absorvidos primeiro pelos Bandeirantes e depois para as cidades. Eles foram a ponte cultural da culinária indígena para o homem branco europeu.
Uma coisa muito interessante que eu descobri pesquisando essa fase da nossa história, é que os indígenas não queriam comer as galinhas e frangos que os bandeirantes levavam, porque tinham nojo daquela ave estranha, que comia de tudo.
Mas com a presença dos Bandeirantes e depois dos jesuítas missionários, aos poucos os indígenas incorporaram o frango à sua dieta.
Esses Bandeirantes foram os responsáveis direto para o aparecimento do Norte do Paraná, de São Paulo, de Minas Gerais, de Goiás, de Mato Grosso, e do que se convencionou chamar de "Paulistãnia", a grande região formadas hoje por esses Estados, mas que naquela época não era dividido assim.
Os Bandeirantes existiram até quase a criação da área urbana das cidades dessa região, e aos poucos migraram para o serviço de tropeiros. Peões que levavam gado de uma fazenda para outra por grandes distâncias.
A comida que hoje conhecemos como comida tropeira, nada mais é do que a comida dos Bandeirantes, que com o passar do tempo, mudou de nome. Ou melhor — ganhou um nome. 
Então meus amigos!
Agora que nós arrumamos o cenário, escalamos os atores e atrizes e traçamos o roteiro. 

Finalmente podemos começar a falar da culinária brasileira e da grande Paulistânia.



quarta-feira, 16 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 4



Indigenas: os verdadeiros donos do fogo!




Amigos, nessa nova postagem, vamos ter que voltar mais um pouco no passado para entender a culinária brasileira — principalmente, a culinária da Paulistânia.
Comecei há 3 capítulos, falando dos imigrantes que vieram para o Brasil, por volta de 1900. Depois falei dos negros.
E agora voltando mais um pouco, vamos falar dos indigenas.
Muita gente acha que os indigenas não contribuiram nada — ou muito pouco — para a nossa cozinha. Mas eu digo o contrário! Eles trouxeram alguns dos ingredientes mais usados no Brasil e que ganharam o mundo!
A mandioca, um tubérculo tiícamente brasileiro, foi cultivado, selecionado e desenvolvido pelos indigenas. 
Quando os europeus chegaram aqui, essa raiz fazia parte da alimentação das tribos brasileiras, de norte a sul do país.
A farinha de mandioca, o tucupi e até o polvilho eram subprodutos dessa raiz e faziam parte da dieta dos povos originários — sempre quis escrever "povos originários" em algum texto meu.
O milho, originário das Américas central e do Norte, já havia atravessado o continente e fazia parte da alimentação indigena em praticamente, todo território brasileiro. 
Até a pipoca já existia!
Batata-doce, pinhão, banana-da-terra, inhame, cará, madioquinha, (batata barôa), goiaba, açaí, palmito pupunha, juçara... Tudo isso é herança indigena na nossa culinária.
A forma de cozinhar direto no fogo com os alimentos enrolados em folhas de bananeira, é uma herança indigena. 
Hoje, quando você prepara alimentos no seu forno, enrolados em papel-alumínio, saiba que essa técnica vem daí!
Não se cozinhava assim no mundo!
Uso de pimentas — várias pimentas — e de raízes amargas, também tem grande influência indigena.
E o pirão!
Prato típico brasileiro, que é uma sopa de peixe engrossada com farinha de mandioca. Uma delícia... — Também é indigena!
Ou seja!
Você foi apanhado de surpresa!
Menosprezava os primeiros donos desse terreno aqui, e não sabia que eles foram tão importantes para o registro gastronômico do pais inteiro.
E tem mais! Não foram só importantes para nosso país, mas sim, para o mundo todo!
Na África, a mandioca é de primeirissima necessidade. Existe uma farinha super-nutritiva, feita com casca de ovos, folha de mandioca e sementes de abóbora, que tem salvado vidas de comunidades desnutridas no mundo todo, principalmente na Àfrica.
O milho ganhou quase todos os países do mundo e a pipoca é mais importante que os filmes de Holliwod nas salas de cinema.
Então, à partir de hoje, saiba: A culinária indigena existe! 
Mas como todas as receitas do nosso país, foram adaptadas, misturadas e re-criadas.  

Então, quando se sentar em frente da TV para assistir uma série e comer sua pipoquinha de micro-ondas, agradeça a Tupã!



segunda-feira, 14 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 3



Feijoadis brasillys gosturesensis




Bom... E lá vamos nós com nossa primeira polêmica:
Quem inventou a feijoada?
Os portuguêses ou os escravos?

Antes de tudo, nós temos que saber um fato: 
Na Europa existiam alguns pratos parecidos com a feijoada, mas que na maioria das vezes, eram feitos com feijão branco.
Na França existia o cassoulet.
Na Espanhana o puchero que muitas vezes, usava grão-de-bico em vez de feijão.
E em Portugal, o cozido português, que além de carnes também levava embutidos
Históricamente esses pratos são considerados avós da feijoada.

Então quem inventou a feijoada foram os portugueses!

Calma, gente; vamos fazer uma perguntinha antes:
E na África? Não existe um prato semelhante à feijoada?
Existe!
Em Cabo-verde, existe o cachupa, um prato típico, também conhecido como feijoada africana. A cachupa é feita com feijão, carne, e vegetais.
Em Angola, existe a feijoada Angolana, similar à feijoada brasileira, mas com feijão branco ou castanho e carnes como coxa de frango, carne de porco e carne de vaca, além de chouriço e vegetais.

Pronto! Então, quem inventou a feijoada foram mesmo os escravos africanos.

Ops... aqui temos um problema:
Tanto Cabo-verde, quanto Angola, eram colônias de Portugal, e não há registros desses pratos, antes da chegada dos portugueses. 


Ixi... Então quem inventou a feijoada foram os portugueses mesmo...

Calma de novo!
Ainda não temos o veredito... Vocês estão com muita pressa!
A nossa feijoada, como existe hoje, tem ingredientes de várias culturas:
Farinha de mandioca — herança indigena.
Couve — herança portuguesa, mas refogada com alho e gordura — Tem quem diz
que é herança das mamas italianas.
Laranja — herança portuguesa. Misturada com pratos salgados? Coisa de Françês.

Então, agora sim, chegamos agora ao veredito:
Chegamos não! Cheguei. Porque o juiz aqui desse texto sou eu.
Mas se não concordar com a sentença, comente aí nos comentários explicando porquê.

No Brasil colônia, a comida européia não era abundante. 
As pessoas que moravam aqui, tentavam, da melhor forma possível, adaptar os produtos nativos, para "replicarem" aquelas receitas do coração.
As negras que foram trabalhar na "casa grande", aprendiam a cozinhar essas receitas e com o tempo, agregaram a elas seus conhecimentos da cozinha africana.
A mão das negras eram mais carregadas em tempero. Pimentas, ervas e tempos de cozimento.
Tudo foi um "blend" de conhecimento — e, desse "blend", aproveitando produtos de outras cozinhas, (como a couve européia e farinha indígena), nasceu a feijoada brasileira.
Então meu veredito é:
A feijoada não é portuguesa. Não é africana.
A feijoada é um prato típico do Brasil. Criada por brasileiros.
Gente simples, que — como alquimistas — misturaram ingredientes considerados não nobres e transformaram em ouro gastronômico.

E tenho dito!



quinta-feira, 10 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 2


 

Da senzala à casa grande: Sabores sendo construídos




Vamos continuar com a nossa saga pela origem da culinária brasileira — principalmente da região conhecida como Paulistânia — voltando alguns anos no passado.
Para entender bem nosso registro gastronômico, teremos que ir e vir na história. Mas vai ser fácil de acompanhar. 

Antes dos imigrantes europeus desembarcarem no Brasil, os escravos negros de origem africana, foram trazidos pelos portugueses para trabalhar nas fazendas.
Os portugueses compravam ou trocavam esses indivíduos, que, em sua grande maioria, já eram escravos de tribos e povos rivais — grupos que haviam subjugado suas tribos e os escravizado. 
Infelizmente não existe santo nesse mundo. O ser humano é naturalmente malvado — tenha ele a pele da cor que tiver. 
Mas esse assunto é complicadíssimo e muita gente usa mais o coração do que a razão para debater sobre ele. 
Então vamos voltar ao nosso assunto principal, que é a culinária.
Os negros não eram bem tratados. Geralmente comiam as partes menos nobres dos porcos e bois, que eram mortos para a subsistência das pessoas que moravam nas colônias das fazendas. 
O arroz e o milho que era destinado aos negros, eram de grãos quebrados, chamados arroz de segunda e milho quirela.
Abóbora, galinhas e galos velhos, feijão preto, mandioca e frutas nativas como a goiaba, também faziam parte da dieta dos negros.
A mandioca, natural do Brasil, e o milho que era natural das Américas, logo caíram no gosto desses negros, que passaram a cozinhar pratos que até hoje são queridos pelo nosso povo, como a canjica, a "vaca-atolada", a galinhada, o cuscuz de milho, o bolo de fubá e doces como Mané-pelado, goiabada, pamonha e cural.
Nessa época, grandes cozinheiras negras, trabalhavam na sede das fazendas e cozinhavam para seus "patrões", que lhes ensinavam a culinária de origem européia e essas negras adaptavam esses pratos, aos produtos que existiam no Brasil.
O trigo, era um alimento imprescindível para os portugueses que moravam na Europa, mas, por aqui, era escasso. Por isso, o fubá e o polvilho entraram na dieta, tanto da casa-grande, quanto da senzala.
Agora a gente iria viajar um pouco mais para o passado, para entender o futuro, e iríamos falar dos indigenas na próxima postagem.
Mas eu resolvi colocar um pouco de pimenta, ainda dentro do tema dos escravos, e suas cozinheiras maravilhosas e fazer a primeira provocação da nossa viagem: a feijoada!
A primeira grande divergência histórica de uma receita símbolo do Brasil.
Por isso, — os indígenas que nos perdoem — na próxima postagem vamos falar de feijoada.
Se eu conseguir, é lógico... porque com essa minha boca grande, acabo falando de várias outras coisas paralelas!

Espero que estejam gostando e se preparem, porque muita água ainda vai passar debaixo dessa ponte.



Ao lado estão as imagens das capas dos meus dois livros.
Se quiser adquirir algum deles, é só clicar na imagem, e será direcionado para a loja.
Também tem o link na aba: Onde me encontrar, para adquirir o segundo livro na versão e-book, na Amazon.
 


segunda-feira, 7 de julho de 2025

Raízes da culinária brasileira, principalmente da Paulistânia - Parte 1

 


Os imigrantes e a formação de um novo paladar



Amigos, eu vou fazer uma grande postagem sobre as origens da culinária brasileira.
Principalmente da região chamada por historiadores gatronômicos de: Paulistânia.
Sei que na blogosfera muita gente não curte postagens longas, então vou dividir em algumas partes, mas vou fazer de forma, que cada uma delas seja fechada em uma leitura bacana.

Um pouco antes da Primeira Guerra Mundial, os europeus já viviam sob grande tensão.
Pequenas guerras e conflitos já pipocavam aqui e ali, e o povo sabia que, a qualquer momento, uma guerra de dimensão continental poderia acontecer.
Foi nesse clima quase insustentável que muitos imigrantes vieram para o Brasil. Descobriram, por meio de "facilitadores", que havia grande demanda de mão de obra nas grandes fazendas. Principalmente nas plantações de café, fumo, cana-de-açúcar e nas fazendas de gado leiteiro.
Nessa época o Brasil estava abandonando gradualmente a mão de obra escrava. Apesar da abolição ter ocorrido oficialmente em 1888, em alguns lugares, até por volta de 1910, ainda se praticava essa barbaridade.
Falando nisso; ano passado encontraram fazendas no Rio Grande do Sul, onde pessoas trabalhavam quase como escravos — mas essa é uma outra história, que qualquer dia nós podemos debater por aqui.
Voltando à conversa de hoje, esses europeus vieram para o Brasil, com o sonho de trabalhar, crescer e prosperar. 
Eles desembarcavam principalmente no porto de Santos, onde agenciadores levavam os que não tinham dinheiro para trabalharem nas fazendas de São Paulo, Minas Gerais, Norte do Paraná, sul de Mato-grosso e de Goiás. 
Já os que tinham melhores condições financeiras, eram quase que engambelados pelos mesmos agenciadores, que os vendiam terras em lugares de mata fechada e de difícil acesso, como foi o caso, dos italianos e alemães na serra Gaúcha.
Calma, gente! 
Eu prometi que essa postagem seria sobre "as raízes da culinária brasileira", e a gente ainda vai chegar lá. Mas o "trem", como diz o mineiro, que será personagem importante na nossa história, não é tão simples assim. 

Mas por hoje paramos por aqui.


Coloquei a imagem das capas dos meus dois livros ao lado.
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quarta-feira, 2 de julho de 2025

Tachos Calvino

 


Segundo a religião cristã, haverá um dia em que você, eu, tu, ele, nós, vós e eles, serão, seremos, serei, sereis, julgados!
Depois desse julgamento, se você aceitou a Jesus como seu único e suficiente salvador, você deverá, segundo a Bíblia, ser salvo e ir morar no céu eternamente. 
Mas se você não aceitou Jesus, e torceu pelo lobo mau a vida toda, certamente você vai fritar no tacho do capeta — eternamente — e de vez em quando o capiroto vai te dar umas cutucadas com o tridente, para ver se você já está bem fritinho. 
Mas esse prato, meu amigo,  onde você é o ingrediente principal, nunca vai ficar pronto, afinal, eternamente é muito tempo! 
Quer moleza? Então vira católico, aceita Jesus mais ou menos, e aí talvez, mas apenas talvez, você fique num lugar fedido, chamado purgatório, até pagar seus pecados, e só depois que talvez, mas apenas talvez, você vá morar no suburbio do céu.
E como tudo que é ruim, ainda pode complicar mais um pouco, apareceu um cidadão chamado João Calvino, que formulou uma teologia baseando-se em versículos bíblicos, que diz que as coisas não são bem desse jeito! 
Oras bolas! O meliante escolhe Jesus como seu único e suficiente salvador e será salvo. 
Não! 
O Calvino bolou uma trama teológica, onde a simplicidade da salvação se dá apenas para um grupo de pessoas, que ele chamou de escolhidos, eleitos, ou predestinados. Segundo Calvino, Deus, na marra, fará com que alguns escolham a Jesus e o aceitem, mesmo que não queiram, como seu único e suficiente salvador, irresistivelmente, "fantochemente", e pasmem — livremente!
Segundo ele, a outros, mesmo que queiram, não será dada a chance de escolher a Jesus, mesmo que o cara assista uma pregação, encontre uma Bíblia em uma ilha deserta e se convença de que Deus é o caminho, e queira trilhar esse caminho, Deus vai mexer os pauzinhos para que o coração desse fulano se endureça e ele não aceite Jesus verdadeiramente, porque ele não é um dos eleitos. 
Na cabeça do Calvino, mesmo que Deus tenha interferido pro cara não aceitar a Jesus, a não escolha, é "calvinamente" classificada como livre.
Cês tão entendendo?
Esse Calvino tem milhões de seguidores no mundo, na verdade, entre as igrejas evangélicas tradicionais, esse cidadão é o mais influente teólogo. 
Seus discípulos são combativos, e sua doutrina tem entrado em igrejas que tradicionalmente pensavam diferente disso. Essa questão que eu coloquei aqui, é apenas um agente complicador da teologia calvinista, existem outras tantas, pois sua doutrina é calcada em 5 pontos, e cada ponto é mais polêmico que o outro.
Ainda bem que no dia do julgamento, quem vai julgar é Deus e não, nenhum calvinista, senão, não iria caber tanta gente no tacho do capeta. Na verdade, acho que o capeta teria que abrir uma fábrica de tachos! Imagine o slogan da fábrica: Tachos Calvino, eternamente esperando por você!
Eu hein... Tô fora!



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