segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Chatos e rebeldes


Tem uma música da banda Garotos da Rua chamada, "Eu toco Rock". Na letra, o cantor Bebeco Garcia grita cantando — ou canta gritando:
Eu toco Rock!
Eu não do bola pro resto,
pode dizer que eu não presto.
Não tenho nada com isso,
pode dizer que eu sou lixo.
Tá no fim...
... não tem futuro pra mim.
Me trata como bandido.
Me chama de caso perdido!
Prejuizo garantido...


Como é a vida né?


Uma vez na faculdade um professor leu um texto que dizia mais ou menos assim:
Essa juventude não tem vergonha!
É um bando de preguiçoso.
Não respeitam os pais!
Se vestem mal.
São chatos e mal educados.

Um texto normal para nossos dias. Afinal, a gente sempre reclama da juventude. Comparamos com nossa geração e dizemos que os jovens são um bando de frouxos. 

Nutellas! — bradamos do alto de nosso julgamento, como está na moda dizer.
Mas o problema, é que o texto acima, foi extraído de um papiro egípsio anterior a Cristo.
Olha só!

Meu pai era músico. Acordionista. Tocava pra caramba! Tipo fenômeno mesmo.
Tocou com vários cantores, e na época que morava em fazendas, ele era o showman. 
Carregava um baile de 4 horas, sózinho nas costas.
Naquele tempo os sanfoneiros — meu pai dizia acordionista e não sanfoneiro — faziam os bailes sózinhos ou acompanhados de um violão.
Ele tocava músicas "clássicas" para aquele público: valsas, boleros, músicas românticas, chorinhos e conções sertanejas raiz.
Uma vez ele me viu assistindo a um programa que passava na TV Cultura, chamado: Boca Livre.
Esse programa trazia bandas de garagem, punk e pós punk, que se enfrentavam em um festival que durava o ano todo.
Ele achou que eu estava usando drogas!
Falou que aquilo não era "música de gente!"
Ficou puto de raiva!
Ele tinha um sonho de me ver tocando acordeon... Até fiz aulas um bom tempo e até aprendi a tocar algumas músicas.
Mas não deu em nada!
Eu ouço rock e ouço blues.
Setenta por cento de meu tempo músical é escutando esses ritmos.
Na época eu fiquei revoltadinho com a negação do meu pai.

Com o tempo ele acabou aceitando um pouquinho o meu gosto musical.
O gosto dele — eu amava! E ele sabia disso...
Amava ver ele tocando. Realmente era um mestre.
Herdei dele o gosto por música clássica também. 
Chorinho é lindo demais e emociona. 
Banda e orquestra sinfônica também emocionam.
Adoro aquelas bandas de Charleston americamas, com banjo, violão, washboard e metais.

Hoje, eu tento não implicar com meu filho de 13 anos.
As vezes não consigo.
Acho essa geração parada demais.
Temos que falar mil vezes a mesma coisa.
Eles não tomam iniciativa... Mas e nós?
Nós éramos melhores?
Acho que no final, o que vai valer, é a desenvoltura quando as verdadeiras obrigações da vida chegarem.
Agora ele é criança e eu sou chato. Um chato cuidadoso e presente — mas sou chato.

O Bebeco Garcia morreu no começo dos anos 2000.
Nos seus últimos shows ele era considerado um dos melhores guitarristas do Brasil e o melhor no estilo slide.
Ele conseguiu superar seus monstros e os seus próprios julgamentos.
Ele ainda toca rock, mesmo depois de morto. 
Toca na minha vitrola.
Meu filho vai ter a vitrola dele.
E assim a vida vai tendo seu ciclo...
Viver é bom demais — sejamos nós os chatos ou os rebeldes do momento — viver é bom demais.






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