sábado, 9 de abril de 2016

Virgem Maria - parte 2






A água bateu no rosto de Armando que começou a recobrar os sentidos lentamente. Primeiro, zonzo, ele viu uma imagem desfocada se mexendo em sua frente, trêmula e embaçada, que fez Armando buscar lá no fundo de sua mente de quem seria aquela figura.  Depois de piscar os olhos várias vezes Armando esforçou-se e reconheceu a imagem de Matildes, que se materializou na sua frente. No primeiro momento ele não entendeu muita coisa, e olhou com indecisão para o mundo, não sabendo o que se passava. Foi então que olhando à sua volta, ele viu que todos os seus vizinhos estavam ali parados, com cara de triste, como se velassem algum defunto. Algumas vizinhas, com o terço na mão, oravam pedindo a Deus que nada lhe acontecesse, enquanto sua esposa, desesperada, batia em seu rosto e gritava: - Armando! Armando! Levaram Juanito! Levaram Juanito!
          - Levaram Juanito? – disse finalmente acordando de seu transe. - E agora mulher? Temos que ir buscá-lo!
          - Mas como meu marido, se foi o próprio monsenhor Fernando quem veio pessoalmente buscá-lo? Eles vão queimar nosso filho!
          Armando se levantou apoiado pelo vizinho Sr Argemiro, andou lentamente até os fundos de sua casa, abriu a porta de um antigo armário, pegou seu cinto transversal, ajeitou a bainha de sua espada, apanhou a espada que estava dependurada no armário, embainhou-a, foi até seu cavalo, arriou-o, deu água, deu um pouco de milho e veio até a frente de sua casa puxando o cavalo pelo arreio. Os amigos e vizinhos ainda estavam ali consolando dona Matildes, que chorava desesperada. Dona Matildes olhou para o marido e conhecendo bem o quanto ele era teimoso e irredutível quando tomava uma decisão, conseguiu apenas falar: - Meu marido eu sei que você vai atrás de salvar o nosso filho, mas se isso não for possível, por favor, pelo menos volte você, vivo, aqui pra nossa casa.
          - Calma Matildes. – falou o marido mansamente. - Vamos voltar os dois.
          Armando ainda sentindo dores na cabeça, olhou zonzo para a estrada que saia do vilarejo em direção as muralhas do castelo de Manzaneda, e depois de alguns passos de seu cavalo, percebeu que alguém vinha em sua direção, cavalgando, gritando e acenando para que ele o esperasse. Armando parou o cavalo e se virou para ver quem seria aquele que gritava e acenava insistentemente. Para sua surpresa, tratava-se de rapaz, muito jovem que se aproximou e com uma saudação apresentou-se: - Olá senhor Armando, eu me chamo Miguel, conheço seu filho lá da escola do convento, ele é uns quatro anos mais novo do que eu.
- Olá Sr. Miguel - respondeu Armando sem saber no que pensar.
- O Sr. pode me chamar de Miguelito, eu estudo as leis dos homens e da Igreja lá na escola, e vi que condenaram seu filho sem julgamento algum, para queimar na fogueira, por isso resolvi ir buscá-lo junto com o senhor!
- Não meu jovem...
- Miguelito por favor!
- Não Miguelito, isso pode ser perigoso, eu estou disposto a trocar minha vida pela do meu filho, mas você não tem nada a ver com isso.
- Pode deixar Sr Armando... Vou lhe ajudar mesmo assim e nenhum de nós vai perder a vida. Eu vou junto com o senhor, mesmo o senhor querendo ou não.
          Armando coçou a barba rala, franziu a testa e pensou se aquilo estava correto. Olhou para aquele rapazinho franzino, trajado com roupas rústicas de pano grosseiro, montado em uma mulinha velha e magra, sem espada e sem porte de cavaleiro. Analisou-o de cima abaixo, até que fixou seu olhar nos olhos de Miguel, percebeu pelo brilho deles, que não teria jeito. O rapazinho iria mesmo até o fim.
            - Vamos então Miguelito. Fazer o quê? Você parece ser mais teimoso do que essa mula velha que monta.
- Hahahahahaha, o senhor não conhece minha mula, ela é velha, mas é muito competente.
Armando apenas olhou de rabo de olho para quele menino e balançou a cabeça pensando em como poderia se arrepender mais adiante por deixá-lo ir.





11 comentários:

  1. Ora cá temos mais um pedacinho de um conto de que muito gostei e que reli com gosto.
    Um abraço e bom Domingo

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  2. Muito legal,André, como sempre! Bom te ler! abração,chica

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  3. Amigo André, reli o anterior, para poder entender a sequência, se puderes postar com tempo menos espaçado será bom, não sei quantos capítulos terão esse seu lindo conto, mas é assim, as pessoas podem deixar de se interessar, minha opinião.
    Amei ler e está bem escrito, no tempo da Inquisição era assim, a Igreja Católica Apostólica Romana deixou essa mancha que rendeu e ainda rende bons livros, lembra do livro "O Nome da Rosa"? O autor morreu faz pouco tempo!Pois é, eu o li inteirinho e assiste ao filme e mesmo assim não consegui entender bem o porquê de tudo isso.
    Abraços meu amigo querido Andre!

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    1. Vou seguir seu conselho amiga!

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    2. Que bom, acompanharei, amo ler seus escritos! Abraços apertados meu amigo!

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  4. O conto continua muito bom, com uma narrativa bastante fluída e sem tempos mortos.
    Veremos se terá sido bom aceitar Miguel como seu companheiro, tendo em vista reaver o seu filho.
    xx

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    1. Oi Laura!
      Então, esse Miguelito é um grande linguarudo, não sei não!!!!!!

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  5. Você sabe prender o leitor aqui, né?

    Dá-lhe, Miguelito!

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    1. E olha que prender é a sua especialidade né policial! Hahahahahahahahahahaha.

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