segunda-feira, 25 de abril de 2016

Virgem Maria - parte 7




As pessoas da cidadela sabiam que ao raiar do dia a fogueira santa seria acesa e todos os bruxos e hereges seriam queimados vivos.
Assim a justiça divina seria feita e essas almas, sofrendo aqui na Terra, com essa tortura enorme, poderiam talvez ser perdoadas e ganhar a salvação eterna, sem deixar antes, de passar algum tempo no purgatório, para se purificar e deixar de vez, a influência maligna sobre seus seres.
Seu Armando e Miguelito passaram a noite em vigília esperando que a guarda da cidade e os santos monges trouxessem as pessoas para o sacrifício, assim eles fizeram turnos onde um ficava acordado três horas passando a “guarda” para o outro que ficava outras três horas na espera e assim sucessivamente.
Miguelito até conseguiu dar uns cochilos na escadaria da igreja mas seu Armando não conseguiu pregar os olhos, pois talvez aquelas fossem as últimas horas de vida de seu filho, e ele, como pai aflito, ainda não tinha nenhum plano ou saída, que lhe desse esperança de salvação para Juanito.
As cinco da manhã o povo começou a chegar das casas e se aglomerar na praça em frente ao amontoado de lenha que fora milimetricamente colocado ao centro da praça, com várias madeiras encaixadas e sobrepostas formando uma espécie de pirâmide, que viraria cinzas, assim que Monsenhor Fernando desse a ordem de atear fogo.
Ao cantar dos primeiros galos a comitiva que trazia o alcaide Arguiles, Monsenhor Fernando, mais uma dúzia de monges e uma grande quantidade de cavaleiros e soldados, apareceu no final da pequena ruela que começava na porta do convento. A comitiva vinha em passos quase fúnebres, como aquelas comitivas que acompanham um caixão para a cova, a frente, os noviços estudantes do convento, vinham entoando cânticos em latim e rezando ladainhas antigas, enquanto, mais atrás, alguns monges marcavam o passo com instrumentos de percussão, e a cada quatro passos eles soltavam um baque surdo e pesado, no couro cru do tambor, fazendo o ritmo da comitiva continuar, feito os ponteiros de um relógio, sem atrasar nem adiantar nenhum minuto.
Após esses monges três pessoas encapuzadas e com as mãos amarradas pra trás vinham atrelados uns aos outros por uma corrente que prendiam seus pés, não deixando nenhuma chance de fuga.
Quando a comitiva se aproximou da praça da igreja, as pessoas abriram caminho e deram passagem, até que com rufar dos tambores e um estanque seco a comitiva parou bem de frente a lenha preparada para a fogueira onde os hereges seriam queimados.
Monsenhor Fernando abriu caminho pelo meio da comitiva e se colocou à frente de todos. Quando viram o Monsenhor, todas as pessoas se dobraram fazendo reverência a ele como se realmente ele fosse um ser divino ou divinizado por Deus, para guiá-los na terra. Com gesto suave levantando o braço, o Monsenhor dispensou a todos da reverência, que se postaram em pé, calados e ávidos pelo show macabro que estava pra começar.





10 comentários:

  1. Amigo André, essa fase que nos relata é de uma Inquisição dos primórdios, da que não perdoava nada, uma terrível mancha que nunca será esquecida, veremos o que será feito do filho do seu Armando?!
    Já li muitos livros dessa época,nem só da Inquisição Católica, por isso não me prendo a nenhuma religião!
    Abraços apertados amigo escritor, muito bom, prende-nos a atenção!!!

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    1. Essa época deveria ser terrível, e nós da blogosfera estaríamos certamente na fila da fogueira, hahahahahahaha.

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  2. Em dia especial para Portugal, eis-me aqui para ler mais um pouco deste apaixonante conto.
    Abraço e uma boa semana

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  3. Momentos difíceis que marcaram a história são cheio de mistérios.


    Um lindo dia pra você =)

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    1. Verdade Bell, e ainda chamam esse período de período negro, e dizem ser pobre de história.

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  4. Está escrevendo um belo enredo, amigo. Descrevendo com maestria um tempo medieval, de atrocidades como a inquisição. Muito bom. Estou tentando ver se consigo escrever um livro assim, tipo romance, alongado, com cenários, vários personagens, alternâncias etc, mas não sei se é meu forte. Tentar eu vou. Obrigado. Abração.

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    1. Tente sim, e tenho certeza que vai conseguir, vc tem capacidade de sobra.

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  5. Hoje, eu passei só para pedir um favor. Se tiver um tempinho passe pelo Sexta, e junte-se à festa.
    Abraço

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