Os
guardas trouxeram Juanito, que ainda estava encapuzado e com as mãos amarradas nas
costas e o colocaram junto a Monsenhor Fernando.
-
Tirem o capuz e desamarrem suas mãos. - ordenou o santo homem.
A
olhos atentos esta era uma visão surreal, dois guardas enormes, com aquelas
armaduras reluzentes, e suas espadas afiadas e prontas para atravessar
facilmente as entranhas de qualquer inimigo, desamarrando cuidadosamente, um
garotinho de alguns poucos anos de vida, com a estatura normal de uma criança,
com as mãozinhas normais de uma criança, amaradas como se fossem de um leão
prestes a atacar e engolir toda aquela multidão.
Monsenhor
Fernando pegou uma Bíblia, colocou-a na frente de Juanito e falou:
- Senhor Juan de Castro, o senhor reconhece
que esta é a Bíblia sagrada e que ela é a palavra de Deus entre os homens na
terra?
Juanito
olhou a sua volta, viu os rostos das pessoas que o encaravam como se encarassem
o próprio demônio, com olhares de desaprovação e condenação, e no meio da
multidão, reconheceu seu pai, com o olhar marejado, aflito e triste que a
situação merecia.
- Sim
Monsenhor Fernando – falou o menino - eu reconheço que a Bíblia é a palavra de
Deus.
-
Senhor Juan de Castro - prosseguiu Monsenhor Fernando - o senhor sabe que um
juramento feito publicamente e com a mão sobre a Bíblia é um juramento muito
sério e que se tratado com injúrias pode te levar para o inferno sem salvação?
- Sim
Monsenhor Fernando eu sei.
- Senhor
Juan de Castro o senhor sabe que queimando na fogueira santa, você poderá pagar
seu crime com o sofrimento e depois de um tempo no purgatório terá absolvição
para sua alma?
- Sim
Monsenhor eu sei.
Monsenhor
Fernando, com um sorriso de sarcasmo, olhou para a multidão e com um leve
balançar de ombros como se dissesse “eu tentei ajudar” continuou o juramento:
-
Senhor Juan de Castro, o senhor, então ciente de tudo o que eu lhe expliquei,
mesmo assim, ainda quer fazer o juramento com a mão sobre a Bíblia?
Juanito
dá uma rápida olhadela para seu pai que faz que sim com a cabeça e diz:
- Sim senhor eu quero.
Sua
resposta causou um alvoroço sobre a multidão que não entendia como uma pessoa
preferia a punição eterna ante a chance de salvação.
- Senhor
Juan de Castro repita comigo - falou Monsenhor Fernando. – Eu, Juan de Castro.
- Eu
Juan de Castro.
- Prometo
com as mãos sobre a Bíblia.
- Prometo
com as mãos sobre a Bíblia.
- Reconhecendo nela a
palavra de Deus.
- Reconhecendo nela a palavra de
Deus.
- Que falarei toda a verdade, nada
mais que a verdade e não impedirei com nenhuma injúria que meu julgamento seja
feito na mais correta justiça.
- Que falarei toda a verdade, nada
mais que a verdade e não impedirei com nenhuma injúria que meu julgamento seja
feito na mais correta justiça.
- Muito bem senhor Juan de Castro -
falou Monsenhor Fernando entregando a Bíblia para um dos frades - o senhor está
sobre juramento santo, então me diga, foi o senhor mesmo que escreveu aquele
poema?
- Sim senhor, fui eu mesmo.
- O senhor sabe que é proibido
escrever qualquer tipo de coisa que tenha como tema os sentimentos carnais entre homens
e mulheres?
- Sim
senhor eu sei.
- O
tal poema que o senhor escreveu o senhor se lembra dele?
- Sim me lembro.
- Ele foi escrito para uma mulher?
- Sim senhor, foi escrito para uma
mulher!
- Hahahaha, obrigado senhor Juan de Castro! -
falou Monsenhor Fernando se virando aos soldados. - Amarrem ele de novo e vamos
começar o sacrifício da purificação de sua alma.
Foi
então que do meio da multidão Miguelito, subiu em cima de um barril e começou a
declamar em alto e bom som:
- “Ó mulher que suga meu ar.
Que
faz minha face enrubescer.
Não sou nada sem sua presença.
Nem sequer existo longe de ti.
E quando chego-me perto de ti,
percebo minha insignificância.
Apenas me sinto uma planta,
indefesa, imóvel, que necessita de seus raios! De sua energia!
Ó
mulher, és a melhor entre as mulheres.
És aquela por quem meu coração
dispara.
És aquela por quem minha vida grita
a plenos pulmões! Quero ser teu escravo, quero ser teu súdito, quero ser seu!
Agora e para sempre!
Todos os homens, se te conhecessem
fariam assim como eu!
Jurariam
amor, jurariam fidelidade.
Agora e para sempre!”
Bom dia amigo Andre!
ResponderExcluirO belo poema nem sequer menciona paixão carnal,(pode ser amor à Virgem Maria, quem sabe?!) Só você né? No seu belo conto mostras com clareza a cegueira que é o domínio dos homens, uns sobre os outros em nome da fé, da igreja e o pior, em nome de Deus!
Eu quando leio a Bíblia também encontro cada coisa, pois a leio não como evangélica, não tenho e não quero ter nenhuma religião, já tentei ir em igrejas, mas todas elas nos faz sentir culpados, eu não gosto disso!
Abraços e esperemos o desenrolar do conto!
Caro André bom dia.
ResponderExcluirPrimeiro pensei que o poema fosse dedicado à mãe do Juanito. E depois também me ocorreu ser à Virgem Maria.
A Inquisição foi um manancial de crimes. Arrepia pensar na falta de sensibilidade de toda aquela corja.
Estou a seguir o seu conto. Voltarei.
Abraço.
Dilita
Passei para reler mais um pedacinho deste belo conto.
ResponderExcluirAbraço e boa semana
Comecei pela parte 9, mas é óbvio que voltarei ao começo. Quero saber direitinho dessa história de poema proibido.
ResponderExcluirAbraços, André.