terça-feira, 13 de agosto de 2013

Viver no lugar certo




Quatro e trinta e cinco da tarde.
Ele levantou a cabeça e olhou a sua volta. Seus amigos estavam amontoados naquele porão escuro. Nas paredes, manchas de bolor se misturavam com grafites e marcas de dias insanos. Sua cabeça doía, sua pele suja ardia, sua cabeça empesteada de piolhos coçava, seus olhos vermelhos ardiam, seu corpo franzino chorava...
Sua vida chorava! Seus amigos; verdadeiras almas penadas vivas, choravam também. Só o crack lhes afagava. Um afago mortal!
O cheiro do porão era insuportável: Urina, fezes, suor, sujeira, crack, restos de comida, restos de sonhos...
Ele levantou-se vagarosamente. Seus sentidos teimavam em lhe confundir. Seus pensamentos vinham em ondas. Sua percepção da realidade não era confiável.
A alguns meses que ele não tinha nenhum momento de lucidez. Vivia no mundo imaginário da loucura das drogas; um louco são...
Por segundos ele lembrou-se da casa de seu pai. Lembrou-se que lá ele tinha comida, tinha roupas limpas, tinha banho, tinha casa, tinha família... Uma família que ele julgava chata, pegajosa, intrometida.
Uma mãe que lhe fazia perguntas demais, uma pai que impunha regras idiotas. Hora pra chegar em casa, hora pra ver TV, hora para almoçar, hora para entrar na internet, hora para tudo! Uma tirania! Ele detestava essa tirania...
Seus passinhos frágeis o levaram até a luz do sol. Ele colocou a mão em forma de concha em cima dos olhos, tentando se acostumar com a claridade.
Ele fez uma careta e passou a mão calejada de queimaduras no rosto.
O momento de lucidez aproveitou-se dos pensamentos mais ou menos organizados que zumbiam em sua mente e lhe disse: - Volte para a casa de seus pais. 
Ele ouvia vozes o tempo todo; vozes dizendo pra ele usar crack, vozes dizendo pra ele roubar, vozes dizendo pra ele beber, vozes dizendo pra ele perambular pelas sombras, vozes querendo sua alma. Era a primeira vez que uma vóz lhe dava um bom conselho.
Ele resolveu ouvir... Estava com saudade da tirania de seu pai, das intromissões de sua mãe, do amor de sua família.
Com seus passinhos frágeis, um após o outro, parando as vezes para respirar, parando as vezes para descansar... Ele sumiu no horizonte...
O caminho de volta era longo... Mas sabia que sua família estaria lá no final da jornada, lhe esperando de braços abertos.

16 comentários:

  1. Tomara que ele consiga ficar por la´. Um conto bonito, a vida como ela é.

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  2. Cara, li teu conto com uma pontada no coração, sim, infelizmente tenho um ente de minha família que está cativo desta maldição que é o crack, e quando vivenciamos uma situação dessas, sentimos na pele o que vemos na TV, com aquelas famílias que sofrem por uma situação dessas, mas creio em Deus que ele será liberto dessa maldição. Em relação ao texto, como sempre, é uma maravilha te ler Mansim.

    Abração pra ti.

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  3. Oi menino
    Uma estória triste mas real. Infelizmente poucos encontram o caminho de volta. Parabéns pelo texto.
    Abraço

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  4. Puxa!!!
    Uma realidade de muitos e que mostra que o caminho de volta é complicado demais!
    Belíssima explanação sobre um tema tão polemico e tão conhecido ao mesmo tempo.
    bjs
    Ritinha

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  5. Bom dia amigo André, somente pessoas sensíveis assim como você, que pode avaliar o que é a dor da família e a do que entra por esse caminho quase sem volta, mas quando quer voltar e encontra a sua família a lhe ajudar tem mesmo que ser forte e decidido!
    Quem sabe?! A esperança é mesmo a última que morre e vamos torcer para que os que procuram ajuda possam encontrar e vencer esse terrível mal que assola muitos!
    Abraços e tenhas um lindo dia!

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  6. Triste, linda, real e tomara lá ele saiba aproveitar o acolhimento que antes não quis. abração,chica

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  7. Muito bom quando se tem uma família esperando de braços abertos.

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  8. Dedé, meu amigo
    muito real e emocionante, o seu texto!
    ...é comum acreditar que esse é um caminho sem volta. Diante das corriqueiras histórias de famílias destruídas, é quase impossível crer que haja vida após o mergulho.Por muito tempo, perdurou na sociedade o entendimento de que as drogas são um caminho sem volta, e por isso
    muitos dependentes, vagam pelas ruas, moribundos, e caminham para um provável desfecho trágico. Mas, tenho certeza, que vários deles querem se livrar dessa nefasta dependência, e que precisam de apoio, principalmente de familiares, para o restabelecimento de seu vínculo social. Sei que é muito difícil para a família aceitar um filho drogado, mas temos que lembrar que não se tornara um monstro só porque estava usando drogas, nem era um anjo antes, quando não se sabia que ele era viciado — ele continua o mesmo filho. É preciso intuição, amor e perspicácia para ajudar a resolver estes problemas, dando-lhe mais valor,mais amor,mais atenção e receber de braços abertos. Viver no bem é muito difícil, precisamos exercitar todos os dias da vida...
    sim...fiquei muito feliz ao ler o seu comentário, que foi o primeiro do dia, e que mesmo com o meu bla bla,foi possível entender a mensagem que quis passar.
    Obrigado
    Belos dias
    Abraços

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  9. ANDRÉ:Texto emocionante!Uma grande realidade!!Ainda bem que o rapaz ouviu a voz certa do coração e voltou para o aconchego da sua família! Ainda lúcido, conseguiu escolher o caminho certo, pois as drogas são a grande destruição do ser humano!!Parabéns por mais um texto brilhante.

    Beijos amigo e uma ótima tarde e semana abençoados.

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  10. Gostei amigo, parabéns! Abraços!

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  11. Lindo texto André...triste, mas bem real.
    Que bom que ele voltou para onde não deveria ter saído... ao lado da família,
    é o único lugar onde há o verdadeiro amor.
    Tomara que ele cria juízo, e diga não as drogas!
    Abraços!
    Mariangela

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  12. Oi André
    Comovente e muito real o seu conto. Gostei muito, bom seria que muitos jovens fizessem esse caminho de volta...
    Bjos.

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  13. Sensível e muito belo seu texto. Há sempre braços abertos na casa dos pais, para abrigar os filhos que desejam retornar à vida. Bjs.

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  14. Comovente sim! Triste, trágico! Pode-se dizer , que no texto o final foi feliz, o que nem sempre acontece.

    Fiz umas besteiras na vida, mas, felizmente, nunca usei drogas, nem mesmo maconha.

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  15. Me fez lembrar um amigo, que nao teve um final assim tao feliz. Belo texto, parabens.

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