Os amigos mais antigos do blogue, sabem que de vez em quando eu posto novamente alguns contos ou crônicas que eu considero bons. Inclusive, alguns tem mais de uma repostagem.
Mas dessa vez, estou postando novamente esse miniconto, que é um dos que mais tenho carinho por ter escrito, para comemorar a notícia de que ele foi um dos escolhidos para entrar na segunda edição da Revista Alma, de Moçambique.
Eu participei de um concurso cultural realizado pela equipe editorial da revista e esse conto foi um dos classificados. Me senti honrado, por saber que um trabalho meu vai ser publicado no Continente africano.
Então, para vocês relembrarem ou conhecerem:
A festa do Arcanjo Miguel
Ao voltar da caminhada, Lúcio fez um carinho na cabeça de
Bóris, seu fiel amigo, que o esperava balançando o rabo de alegria. Entrou em
casa e foi direto tomar um banho.
Debaixo da água, pensou em como sua vida havia mudado desde
a morte de sua esposa Carmen, há três anos. Nunca havia imaginado, que aos
setenta anos, estaria morando sozinho, com seus filhos todos casados e morando
cada um num canto do país.
Logo ele, que sempre zelou tanto pela família e pelos
momentos felizes com os filhos. Mas é assim mesmo, eles crescem e querem voar
por conta própria. Querem enfrentar o mundo e a vida que tem pela frente, a
parte dos pais é apenas prepará-los; e deixá-los ir.
Depois do banho, com uma toalha enrolada na cintura, Lúcio foi
até a cozinha e pegou um copo de leite com café, umas torradas besuntadas com
manteiga, e foi até seu escritório. Enquanto o computador iniciava, ele se
deliciou com seu lanchinho.Lucio era um idoso moderno: tinha Facebook,
Instagram e se comunicava por WhatsApp com seus netos, sobrinhos e de vez em
quando com algum dos quatro filhos. Ele se orgulhava disso, pois era um velho
conectado ao “novo mundo”.
Quando seus e-mails carregaram, ele foi abrindo um a um:
e-mail de propaganda de lojas virtuais, de sacanagem que seu neto João sempre
mandava, golpes tentando se passar por algum banco ou receita federal e, um
e-mail de seu amigo de longa data; Marcel.
O e-mail do Marcel dizia:
“Bem-vindo a festa do Arcanjo Miguel.”
Se você abriu esse e-mail não poderá mais fechá-lo, até receber
quatro presentes.
A partir de agora você faz parte da corrente do bem e coisas
sobrenaturais vão acontecer com você:
1- Uma ligação telefônica inesperada.
2- Alguém vai lhe dar uma boa notícia.
3- Você fará uma viagem.
4- Encontrará a pessoa amada.
Depois de ler, encaminhe esse e-mail para toda sua lista de
contatos.
— Lá vem... — resmungou Lúcio sorrindo. — O Marcel só manda
bobagem.
Ele não acreditava nessas correntes, mas como estava
bem-humorado, resolveu enviar só para participar da brincadeira. Depois, leu
mais alguns e-mails, navegou um pouquinho pela internet até que o telefone
tocou.
— Alô!
— Paaaaaaiiiiiii, me sequestraram! Socorro!
— Quem, sequestraram quem? Jonas? É você?
— Sou eu pai, é o Jonas! Eles me sequestraram, eles querem
um resgate! Pai me ajude!
— C... co... como is... isso f... filho...
— Nós estamos com seu filho, Jonas! — declarou uma voz áspera.
— Se você não mandar o dinheiro que vamos pedir, nós vamos matar seu filho!
— Ma... mas como? Quem é v... você?
O coração do velho Lúcio não aguentou o baque. A dor no
peito foi enorme. Cambaleando, ele foi até a calçada, onde caiu no chão. A
vizinha chamou uma ambulância, que o levou até o hospital, onde foi internado
direto na UTI.
Horas depois, seu filho Manoel, chegou ao hospital
desesperado. Correu até o quarto do pai e acariciando sua cabeça grisalha, sussurrou
com voz embargada:
— Puxa papai... Como é que isso foi acontecer? A correria
da vida fez a gente ficar tão distante. Eu amo o senhor! Já avisei todo mundo. O
Jonas já deve estar chegando, vê se aquenta aí.
Mesmo inconsciente Lúcio escutou a boa notícia de que seu
filho Jonas estava bem e que até estava vindo.
“Deve ter sido um trote daqueles de presidiários, — pensou,
mesmo sem forças para acordar do coma.”
Com o coração tranquilizado, Lúcio percebeu a seu lado uma
figura muito bonita, com cabelos longos e encaracolados, sorriso no rosto e com
roupa iluminada. Essa figura pegou-o pela mão e falou:
— Olá senhor Lúcio, tudo bem?
— Tudo bem quem é você?
— Eu sou um anjo!
— Um anjo?
— É... Eu vim buscar o senhor, para fazermos uma pequena
viagem...
— Pra onde?
— Por enquanto não posso falar, mas vai ser muito bom, e
sabe quem está te esperando lá?
— Eu sei, a Carmem.
— Como sabe disso?
— Eu li num e-mail. — respondeu Lúcio sorrindo.
— O senhor leu em um e-mail? — perguntou o anjo com cara de
desentendido.— Li... E olha que eu que pensava que esses e-mails do
Marcel eram tudo besteira...